CRIANDO RAÍZES
PHILIP GULLEY
Quando eu era pequeno, tinha um velho vizinho chamado Dr. Gibbs. Ele
não se parecia com nenhum médico que eu jamais houvesse conhecido. Todas
as vezes em que eu o via, ele estava vestido com um macacão de zuarte e um
chapéu de palha cuja aba da frente era de plástico verde transparente. Sorria
muito, um sorriso que combinava com seu chapéu – velho, amarrotado e
bastante gasto. Nunca gritava conosco por brincarmos em seu jardim.
Lembro-me dele como alguém muito mais gentil do que as circunstâncias
justificariam.
Quando o Dr. Gibbs não estava salvando vidas, estava plantando
árvores. Sua casa localizava-se em um terreno de dez acres, e seu objetivo na
vida era transformá-Io em uma floresta.
O bom doutor possuía algumas teorias interessantes a respeito de
jardinagem. Ele era da escola do “sem sofrimento não há crescimento”. Nunca
regava as novas árvores, o que desafiava abertamente a sabedoria
convencional. Uma vez perguntei-lhe por quê. Ele disse que molhar as plantas
deixava-as mimadas e que, se nós as molhássemos, cada geração sucessiva de
árvores cresceria cada vez mais fraca. Portanto, tínhamos que tornar as
coisas difíceis para elas e eliminar as árvores fracas logo no início.
Ele falou sobre como regar as árvores fazia com que as raízes não se
aprofundassem, e como as árvores que não eram regadas tinham que criar
raízes mais profundas para procurar umidade. Achei que ele queria dizer que
raízes profundas deveriam ser apreciadas.
Portanto, ele nunca regava suas árvores. Plantava um carvalho e, ao
invés de regá-Io todas as manhãs, batia nele com um jornal enrolado. Smack!
Slape! Pou! Perguntei-lhe por que fazia isso e ele disse que era para chamar a
atenção da árvore.
O Dr. Gibbs faleceu alguns anos depois. Saí de casa. De vez em quando
passo por sua casa e olho para as árvores que o vi plantar há cerca de vinte e
cinco anos. Estão fortes como granito agora. Grandes e robustas. Aquelas
árvores acordam pela manhã, batem no peito e bebem café sem açúcar.
Plantei algumas árvores há alguns anos. Carreguei água para elas
durante um verão inteiro. Borrifei-as. Rezei por elas.
Todos os nove metros do meu jardim. Dois anos de mimos resultaram
em árvores que querem ser servidas e paparicadas.
Sempre que sopra um vento frio, elas tremem e balançam os galhos.
Árvores maricas.
Uma coisa engraçada a respeito das árvores do Dr. Gibbs: a adversidade
e a privação pareciam beneficiá-Ias de um modo que o conforto e a
tranquilidade nunca conseguiriam.
Todas as noites, antes de ir dormir, dou uma olhada em meus dois
filhos. Olho-os de cima e observo seus corpinhos, o sobe e desce da vida
dentro deles. Frequentemente rezo por eles.
Rezo principalmente para que tenham vidas fáceis. “Senhor, poupe-os
do sofrimento.” Mas, ultimamente, venho pensando que é hora de mudar
minha oração.
Essa mudança tem a ver com a inevitabilidade dos ventos gelados que
nos atingem em cheio. Sei que meus filhos irão encontrar dificuldades e
minha oração para que isto não aconteça é ingênua. Sempre há um vento
gelado soprando em algum lugar.
Portanto, estou mudando minha oração vespertina. Porque a vida é
dura, quer o desejemos ou não. Em vez disso, vou rezar para que as raízes de
meus filhos sejam profundas, para que eles possam retirar forças das fontes
escondidas do Deus eterno.
Muitas vezes rezamos por tranquilidade, mas essa é uma graça difícil de
alcançar. O que precisamos fazer é rezar por raízes que alcancem o fundo do
Eterno, para que quando as chuvas caiam e os ventos soprem não sejamos
varridos em direções diferentes.
Nossa força vem de nossas fraquezas.
RALPH WALDO EMERSON